O historiador François Hartog (2013), elaborou o conceito de Regime de historicidades, para nomear como as maneiras como dadas sociedades em dados momentos perceberam, pensaram e se relacionaram com o tempo, para indicar como elaboraram e articularam, através de suas narrativas, as categorias de passado, presente e futuro, para descrever como um dado indivíduo ou grupamento humano se instaurou e se desenvolveu no tempo.
Sobre esse conceito de Regime de Historicidades de Hartog (2013) é CORRETO afirmar que:
A) O regime de historicidades é a hipótese (o presentismo) e o instrumento (o regime de historicidade), que são solidários, completam-se mutuamente. O regime de historicidade permite formular a hipótese e a hipótese leva a elaborar a noção. Pelo menos de início, um não anda sem o outro. "Por que, perguntaram-me, preferir o termo regime ao de forma (de historicidade)"? E por que "regime de historicidade" em vez de "regime de temporalidade"? Regime: a palavra remete ao regime alimentar (regimen, em latim, diaita, em grego), ao regime político (politeia), ao regime dos ventos e ao regime de um motor. São formulações conceituais para história, que compartilham, pelo menos, o fato de se organizarem em torno das noções de mais e de menos, de grau, de mescla, de composto e de equilíbrio sempre provisório ou instável.
B) O regime de historicidade é a maneira de engrenar passado, presente e futuro ou de compor um misto das três categoriais, justamente como se falava, na teoria política grega, de constituição mista (misturando aristocracia, oligarquia e democracia, sendo dominante de fato um dos três componentes). Portanto é legítimo falar de historicidade antes da formação do conceito moderno de história, entre o fim do século XVIII e o início do século XIX, se por "historicidade" se entender esta experiência primeira de afinidade, de distância de si para si mesmo que, justamente, as categorias de passado, presente e futuro permitem apreender e dizer, ordenando-a e dando-lhe sentido individualizado frente ao conjunto social.
C) O regime de historicidade pode ser tanto amplo, como restrito: macro ou micro histórico. Ele pode ser um artefato para esclarecer a biografia de um personagem histórico, ele pode questionar a arquitetura de uma cidade, ontem e hoje, ou então comparar as grandes escansões da relação com o tempo de diferentes sociedades, próximas ou distantes. E, a cada vez, por meio da atenção muito particular dada aos momentos de crise do tempo e às suas expressões, visa-se a produzir mais inteligibilidade. Ele pode estabelecer uma relação próxima com o empirismo e outras escolas históricas com o objetivo de estabelecer uma hipótese formulada para confirma-la como conceito teórico.
D) O regime de historicidade não é uma realidade dada. Nem diretamente observável nem registrado nos almanaques dos contemporâneos; é construído pelo historiador. Não deve ser assimilado às instâncias de outrora: um regime que venha suceder mecanicamente a outro, independentemente de onde venha. Não coincide com as épocas e não se calca absolutamente nestas grandes entidades incertas e vagas que são as civilizações. Ele é um artefato que valida sua capacidade heurística. Noção, categoria formal, aproxima-se do tipo-ideal weberiano. Conforme domine a categoria do passado, do futuro ou do presente, a ordem do tempo resultante não será evidentemente a mesma.
E) O regime de historicidades pode nos servir da noção de História antes ou independentemente da formulação posterior do conceito moderno de história, tal como a delineou bem o historiador alemão Reinhart Koselleck. Como categoria (sem conteúdo), que pode tornar mais inteligíveis as experiências do tempo, nada o confina apenas ao mundo europeu ou ocidental. Ao contrário, sua vocação é ser um instrumento comparatista: assim o é por construção e livre de uma metodologia teórica que pressupõe cuidados com a relação entre o passado, presente e futuro, mas estabelece percepções da sociedade para o indivíduo.